Trajetórias de vida, marcadores de diferença e as escolhas, caminhos e permanência de médicas de família e comunidade na estratégia saúde da família

INTRODUÇÃO: A Medicina de Família e Comunidade (MFC) é uma especialidade médica avaliada com baixo prestígio dentre as especialidades no mundo todo e sofre com uma dificuldade de atratividade e fixação de profissionais na área. A Estratégia Saúde da Família (ESF), como o maior campo de trabalho do especialista em MFC no Brasil e programa por si só desvalorizado, também sofre reflexos desse desprestígio com a alta rotatividade de profissionais. A tendência crescente à feminização da medicina e da MFC, coloca em pauta a necessidade de se estudar os fatores que influenciam as decisões e trajetórias das carreiras das médicas trabalhadoras do setor. Este estudo se propõe a aprofundar no entendimento de como os efeitos de marcadores de diferença atuam no cotidiano de médicas de família e comunidade que se fixaram em áreas de alta vulnerabilidade social e desprestígio na ESF. METODOLOGIA: Estudo de caráter qualitativo, que dialoga com aspectos da cartografia, realizado a partir da análise do discurso de entrevistas em profundidade feitas com oito participantes médicas de família e comunidade, selecionadas por amostra intencional. As participantes trabalham na ESF, em uma região metropolitana do Brasil, em áreas de alta vulnerabilidade social e índices de violência. RESULTADOS: A análise interseccional dos enunciados apontou para dois grandes eixos de marcadores de diferença: gênero e a articulação classe social/raça-etnia. Um modelo explicativo cartográfico rizomático foi criado para ilustrar as forças e enunciados que se movimentam no mapa do eixo gênero a partir da categoria maternidade. Em razão da força desse movimento, durante a pesquisa de campo, destacamos o gênero como principal lente analítica para esse momento. A articulação classe/raça-etnia apesar de pouco enunciada ou percebida pelas interlocutoras, parece exercer papel significativo nas trajetórias afetivas, no entanto, foram os achados do imbricamento de ser mulher e o projeto da maternidade, que ressignificaram o cotidiano de seus trabalhos em suas vidas influenciando as trajetórias de suas carreiras. Questões sobre a ética e a responsabilização pelo cuidado circulam e se misturam entre os pontos de equilíbrio da vida pessoal/familiar e da vida laboral. A desvalorização e invisibilidade das funções desempenhadas em ambos os pontos dialogam com fatores como a jornada de trabalho, benefícios trabalhistas, remuneração e sustento, divisão de tarefas no lar, cuidado com os filhos. As médicas identificam o vínculo com a comunidade e o exercício ético-político através do trabalho como um ponto de subjetivação e significação dos lugares de privilégio e opressão que ocupam simultaneamente, na circulação entre esses pontos. CONCLUSÃO: A percepção do gênero e a maternidade demonstraram atuar significativamente nas escolhas e caminhos dessas médicas de família. Perceber essa articulação é de grande relevância pois englobam de forma interseccional questões estruturais que podem ser influenciadas pelas políticas de contratação e pelo ambiente de trabalho que as instituições proveem, além de programas que visem a redução de desigualdades de gênero e sociais de forma ampla pelo governo. Os gestores devem se atentar para os achados indicativos sobre a influência de gênero na atratividade e permanência de médicas de família e comunidade na ESF frente à crescente feminização da especialidade.

https://repositorio.ufu.br/handle/123456789/26970

Ano da defesa: 
2019
Linha de pesquisa: 
ATENÇÃO À SAÚDE, ACESSO E QUALIDADE NA ATENÇÃO BÁSICA EM SAÚDE
Autor: 
Natália Pontes de Albuquerque
Orientador: 
Profa. Dra. Flávia do Bonsucesso Teixeira, Profa. Dra. Mariana Hasse
IES associada: 
Universidade Federal de Uberlândia