Codependência em crianças e adolescentes que convivem com familiares alcoolistas: possibilidades e limites para o cuidado na atenção básica

O alcoolismo é um grave problema de saúde pública e estima-se que para cada alcoolista, outras cinco ou seis pessoas podem ser afetadas, o que também coloca a codependência como importante problema de saúde pública. O contexto deste trabalho se refere ao alcoolismo e à codependência dos filhos não adultos de alcoolistas.

O objetivo da pesquisa é descrever como a literatura científica, no campo da saúde, aborda o sofrimento de crianças e adolescentes que convivem com familiares alcoolistas, identificando os fatores de risco e proteção e eventuais experiências bem-sucedidas de intervenção e cuidado, a fim de propor orientações técnicas para o cuidado deste grupo, na Atenção Básica (AB), visando à construção de ações integradas nas redes familiares, nas redes comunitárias e nas redes de atenção à saúde (RAS).

Trata-se de pesquisa bibliográfica sobre a codependência em crianças e adolescentes que convivem com familiares alcoolistas, de caráter exploratório-descritivo. Foram selecionados 49 artigos científicos (27 estudos longitudinais comparativos, 10 estudos transversais comparativos, três estudos transversais não comparativos, dois estudos de abordagem qualitativa e sete estudos de revisão), publicados entre 2004 e 2020, nas bases bibliográficas BVS e SciELO, cujas versões finais estão livre e gratuitamente disponíveis online e abordam o sofrimento de filhos não adultos de alcoolistas (sobretudo as repercussões emocionais, comportamentais e cognitivas) e possíveis estratégias de cuidado.

Embora haja heterogeneidade do perfil de risco, os resultados demonstram maior risco de repercussões negativas para os filhos de alcoolistas (FAs) (transtornos psiquiátricos, sofrimento emocional, ambiente familiar desestruturado, distúrbios do cuidado parental, exposição à violência doméstica, desajuste social, baixo desempenho acadêmico, dificuldades de relacionamento com os pares, dificuldades de comunicação, etc.).  

Dificuldades de ordem econômica, política e gerencial enfrentadas pelo Sistema Único de Saúde e a relativa invisibilidade política e social do alcoolismo e da codependência constituem importantes obstáculos a serem superados. A complexidade do tema conduziu à categorização dos resultados em diferentes dimensões (individual do(a) FA, parental, familiar, escolar, legal, social, cultural, política e da rede de atenção à saúde), nas quais são ressaltados os fatores de risco e proteção e as orientações técnicas que contribuam para o cuidado dessa condição a partir da AB.

Conclui-se que há necessidade de estruturação de uma Linha de Cuidado para crianças e adolescentes que convivem com familiares alcoolistas, integrando uma rede de atores em nível local/ territorial (representados por AB/ equipes de Saúde da Família, equipes do Núcleo Ampliado de Saúde da Família, Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas, escolas, grupos de apoio mútuo como Al-Anon e Alateen, conselho tutelar, assistência social e outros recursos disponíveis). Há também necessidade de uma rede mais ampla de atores políticos e gestores das esferas municipal, estadual e federal, a fim de ampliar as propostas das políticas públicas sobre o álcool e destinar recursos econômicos, humanos e materiais necessários para superar a fragmentação do cuidado (que prioriza o dependente do álcool, em detrimento dos familiares) e a relativa invisibilidade política da codependência de FAs.

Ano da defesa: 
2021
Linha de pesquisa: 
ATENÇÃO INTEGRAL AOS CICLOS DE VIDA E GRUPOS VULNERÁVEIS
Autor: 
Gilda Zamith Ribeiro Campos
Orientador: 
Prof. Dr. Carlos Henrique Assunção Paiva
IES associada: 
Fiocruz RJ