Estresse e sofrimento mental em uma escola de medicina na Bahia
A graduação em medicina, uma das mais almejadas e concorridas no Brasil, se apresenta tomada por um imaginário de status social e estabilidade financeira. Ser aprovado em um curso de medicina significa, para muitos jovens e suas famílias, a garantia de um futuro próspero e promissor. Essa projeção de um sonho quanto à carreira que irá seguir pode conflitar com a formação e os anos de estudo árduo e estressante -- sobrecarga de leitura, dificuldade na administração do tempo, pouco lazer, responsabilidade e expectativas sociais em relação ao papel do médico na sociedade. Condições que predispõem à perda da qualidade de vida, sofrimento e desenvolvimento de transtornos mentais entre os estudantes. Mudanças curriculares, adoção de metodologias ativas de aprendizagem, além de ações de promoção, prevenção e suporte ao aluno em sofrimento, parecem favorecer o desenvolvimento de um cenário mais acolhedor na escola médica. Muitas universidades vêm apoiando esse movimento, com base nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Medicina (DCNs). O presente estudo buscou identificar, por meio da autopercepção dos alunos do curso de Medicina da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), no sul da Bahia, a existência de sofrimento mental e eventos estressores desencadeados após o ingresso no curso, buscando realizar uma discussão com os relatos dos professores. O direcionamento metodológico foi de estudo de caso, por meio de pesquisa qualitativa. Os dados foram obtidos com aplicação de questionários digitais semiestruturados à uma amostra intencional de 45 discentes e 10 docentes inseridos do 1º ao 6º ano, e analisados na perspectiva da Análise de Conteúdo (codificação dos eixos analíticos e agrupamento de dados). A pesquisa está de acordo com aspectos éticos da Resolução 466 de 2012, e foi aprovada pelo comitê de ética e pesquisa. Observou-se que 75% dos participantes consideram apresentar algum tipo de sofrimento mental; quase 40% refere ter adoecido após o ingresso no curso médico, sendo que metade destes alunos atribuem o adoecimento a eventos estressores advindos da graduação, como excesso de exigências de estudo, ausência de atividades de lazer, e atitudes docentes por vezes abusivas. A grande maioria dos professores percebe a situação e demonstra não receber apoio institucional para abordagem e suporte ao aluno. As narrativas discentes apontam fragilidades estruturais do curso e dificuldades na adaptação ao método da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) como possíveis fatores estressores, fato que em geral, diverge da literatura que trabalha com o tema. Conclui-se que o sofrimento mental está presente entre os alunos de medicina da UESC; percebe-se que além das causas frequentemente atribuídas ao sofrimento em outros estudos, a atual estrutura e organização do curso tende a exercer algum impacto negativo no nível de estresse dos alunos; evidencia-se a necessidade de desenvolvimento de espaços reflexivos e democráticos que favoreçam a comunicação entre coordenação do curso, docentes e discentes, visando o planejamento de ações de promoção da saúde mental do aluno.