Produção de sentidos sobre do cuidado em saúde mental no contexto da Estratégia de Saúde da Família

No modelo de atenção psicossocial, o cuidado propõe itinerário terapêutico que leve em conta a construção histórica do sujeito e sua relação com o território, além de práticas de cuidado integral, orientadas por princípios do Sistema Único de Saúde. Apesar de avanços, essa nova forma de pensar/ agir sobre a saúde mental observam-se entraves, relacionados à comunicação inadequada entre profissionais dos serviços da rede de atenção, à prevalência de assistência pautada na medicalização, à fragmentação do cuidado, à fragilidade no processo de matriciamento, à falta de capacitação dos profissionais e às dificuldades referentes à formação ainda pautada no saber biomédico. Nesse sentido, para se alcançar o cuidado e a promoção de saúde mental no contexto da Estratégia de Saúde da Família e de forma integrada à rede de assistência dentro da proposta da Atenção Psicossocial, um caminho seria a ampliação das ofertas terapêuticas por parte das equipes com ferramentas psicossociais, produzidas pela qualificação permanente dos profissionais de saúde, de modo a estimular a construção de fluxos e projetos terapêuticos mais eficazes e articulados aos outros serviços da rede de saúde. Contudo, a Saúde Mental (SM) na Atenção Básica (AB), ainda enfrenta grandes e pequenos desafios em seu cotidiano, como a pouca valorização do ato de "escutar" em consultas corriqueiras. O presente estudo se propôs a analisar os sentidos da produção de cuidado em saúde mental no contexto da Estratégia de Saúde da Família (ESF) e as reorientações das práticas no serviço, tendo como base o construcionismo social, segundo a Psicologia Social. Participaram do estudo 45 profissionais dos serviços especializados de saúde mental (Centros de Atenção Biopsicossocial e Ambulatório) e profissional dos territórios de abrangência de ESF´s, no município de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil. A coleta de dados ocorreu no mês de julho de 2020 a março de 2021. Utilizou-se a técnica de entrevista semiestruturada, em situação metapresencial, mediante consentimento dos participantes assinando o TCLE. O roteiro foi elaborado e testado previamente para esse fim - tendo como base o referencial teórico do Construcionismo Social; os repertórios interpretativos encontrados no levantamento bibliográfico da temática; e as escalas validadas - Escala de Avaliação do Impacto do Trabalho em Serviços de Saúde Mental (IMPACTO-BR) e Escala de Avaliação da Satisfação dos familiares com os serviços de Saúde Mental (SATIS-BR) (BANDEIRA, PITTA & MERCIER, 2000, p. 105-115). Os conteúdos dos diálogos foram analisados a partir da identificação dos repertórios interpretativos dos conteúdos das falas e seu entrelaçamento com a literatura investigada e a interpretação das pesquisadoras, e da análise temática. Os resultados foram apresentados e discutidos a partir de duas categorias temáticas. A primeira voltada para os sentidos acerca da conceitualização dos processos de cuidado em saúde mental em sua integralidade: “Os sentidos dos processos de cuidado em saúde mental”; “Os sentidos das práticas de cuidado em saúde mental no contexto da Estratégia de Saúde da Família”. Na primeira categoria apesar da proposta da Reforma Psiquiátrica na reavaliação do processo de cuidado em saúde mental pautado na reabilitação biopsicossocial, ainda existem lacunas no que se refere à interpretação da proposta de prática de cuidado em saúde mental. Isto porque, pouco se tem avançado no sentido de construir conceitualmente o objeto “saúde mental”. Neste contexto, os participantes dessa pesquisa expressaram sentidos das práticas de cuidado em saúde mental a partir de repertórios interpretativos que transitaram entre os conceitos de saúde mental e de doenças (transtorno) mental, sendo estes elaborados em três subcategorias: os sentidos do cuidado direcionado pela dissociação entre os conceitos de saúde e doença mental; os sentidos do processo de cuidado em saúde mental influenciado pelos manicômios dos imaginários sociais; e os sentidos do processo de cuidado em saúde mental vinculado a proposta da reabilitação biopsicossocial. Na segunda categoria, observou- se que itinerário terapêutico do cuidado não visa somente o processo de medicação e psicoterapia, mas atua a partir das subjetividades nos cenários ocupados, com ampliação de novos arranjos de cuidado, mais humanizados e menos estigmatizado. Nesta premissa, a comunicação adequada entre as equipes e o conhecimento do funcionamento da Rede de Atenção Psicossocial é à base de um fluxo de atendimento em saúde mental de qualidade. Todavia, essa assistência ainda mantém grandes impasses, visto que ainda hoje os profissionais não estão adequadamente capacitados para atuarem no campo da saúde mental na Atenção Básica da Saúde. Diante disso, os sentidos produzidos sobre as percepções profissionais da Rede de Atenção Psicossocial e da Atenção Básica a respeito do papel da Estratégia de Saúde da Família na produção de cuidado em saúde mental, se apresentaram em duas subcategorias: ESF como espaço potente de cuidado em saúde mental e os percalços do cuidado em saúde mental na ESF. Destarte, o presente estudo permitiu refletir que o processo de consolidação do Modelo da Atenção Psicossocial no SUS deve ocorrer pelo fortalecimento do cuidado a partir da escuta dialógica entre os profissionais e a comunidade. Desse modo, a promoção de saúde mental privilegia o cuidado centrado na pessoa e na comunidade e a atenção aos sentidos atribuídos pelos sujeitos aos seus processos de saúde; ou seja, ela trata das emoções, percepções e sentidos do cotidiano e, consequentemente, fortalece ações de promoção da saúde integral aos sujeitos.

Ano da defesa: 
2021
Linha de pesquisa: 
ATENÇÃO INTEGRAL AOS CICLOS DE VIDA E GRUPOS VULNERÁVEIS
Autor: 
Laura Regia Oliveira Cordeiro
Orientador: 
Profa. Dra. Lina Rodrigues de Faria; Prof. Dr. Luiz Antônio de Castro Santos
IES associada: 
Universidade Federal do Sul da Bahia
Arquivo: